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“O Direito Penal tem cheiro, cor, raça, classe social; enfim, há um grupo de escolhidos, sobre os quais haverá a manifestação da força do Estado.” (Rogério Greco – Direito Penal do Equilíbrio)

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Presente para as mamães que estão presas


No último dia 11 foi sancionado o Decreto nº9.370/18, que instituiu o indulto do dia das mães.


Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
 
Concede indulto especial e comutação de penas às mulheres presas que menciona, por ocasião do Dia das Mães.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso XII, da Constituição, e considerando a necessidade de implementar melhorias no sistema penitenciário brasileiro e promover melhores condições de vida e a reinserção social às mulheres presas,
DECRETA:
Art. 1º  O indulto especial será concedido às mulheres presas, nacionais ou estrangeiras, que, até o dia 13 de maio de 2018, atendam, de forma cumulativa, aos seguintes requisitos:
I - não tenham sido punidas com a prática de falta grave, nos últimos doze meses; e
II - se enquadrem, no mínimo, em uma das seguintes hipóteses:
a) mães condenadas à pena privativa de liberdade por crime cometido sem violência ou grave ameaça, que possuam filhos de até doze anos de idade ou de qualquer idade se pessoa com deficiência, nos termos da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 - Estatuto da Pessoa com Deficiência, que comprovadamente necessite de seus cuidados, desde que cumprido um sexto da pena;
b) avós condenadas à pena privativa de liberdade por crime cometido sem violência ou grave ameaça, que possuam netos de até doze anos de idade ou de qualquer idade se pessoa com deficiência, nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que comprovadamente necessite de seus cuidados e esteja sob a sua responsabilidade, desde que cumprido um sexto da pena;
c) condenadas à pena privativa de liberdade por crime cometido sem violência ou grave ameaça, que tenham completado sessenta anos de idade ou que não tenham vinte e um anos completos, desde que cumprido um sexto da pena;
d) condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça, que sejam consideradas pessoa com deficiência, nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência, e as diagnosticadas com doenças crônicas graves ou com doenças terminais;
e) gestantes condenadas à pena privativa de liberdade;
f) ex-gestantes, que tiveram aborto natural dentro da unidade prisional, condenadas à pena privativa de liberdade, desde que comprovada a condição por laudo médico emitido por profissional designado pelo juízo competente;
g) condenadas à pena privativa de liberdade não superior a oito anos pela prática do crime previsto no art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, cuja sentença tenha reconhecido a primariedade da agente, os seus bons antecedentes, a não dedicação às atividades criminosas e a não integração de organização criminosa e tenha sido aplicado o redutor previsto no § 4º do referido artigo, desde que cumprido um sexto da pena;
h) condenadas à pena privativa de liberdade não superior a oito anos por crime cometido sem violência ou grave ameaça, desde que cumprido um quarto da pena, se não reincidentes;
i) condenadas à pena privativa de liberdade não superior a oito anos por crime cometido sem violência ou grave ameaça, desde que cumprido um terço da pena, se reincidentes;
j) indígenas condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça, que possuam Registro Administrativo de Nascimento de Indígena, desde que cumprido um quinto da pena, se não reincidentes; ou
k) indígenas condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça, que possuam Registro Administrativo de Nascimento de Indígena, desde que cumprido um terço da pena, se reincidentes.
Art. 2º  A comutação da pena privativa de liberdade será concedida às mulheres, nacionais ou estrangeiras, nas seguintes proporções:
I - em um quarto da pena, se reincidentes, quando se tratar de condenadas à sanção privativa de liberdade não superior a oito anos de reclusão por crime cometido sem violência ou grave ameaça, desde que cumprido um terço da pena até 13 de maio de 2018;
II - em dois terços da pena, se não reincidentes, quando se tratar de condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça e que tenham filho menor de dezesseis anos de idade ou de qualquer idade se considerado pessoa com deficiência ou portador de doença crônica grave e que comprovadamente necessite de seus cuidados, desde que cumprido um quinto da pena até 13 de maio de 2018; e
III - à metade da pena, se reincidentes, quando se tratar de condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça e que tenham filho menor de dezesseis anos de idade ou de qualquer idade se considerado pessoa com deficiência ou portador de doença crônica grave e que comprovadamente necessite de seus cuidados, desde que cumprido um quinto da pena até 13 de maio de 2018.
Parágrafo único.  Caberá ao juiz competente ajustar a execução aos termos e aos limites deste Decreto, conforme o disposto no art. 192 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal, e proceder à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, quando cabível.
Art. 3º  A autoridade que detiver a custódia das mulheres presas e os órgãos de execução previstos no art. 61 da Lei de Execução Penal deverão encaminhar ao juízo competente, inclusive por meio digital, na forma estabelecida pela alínea “f” do inciso I do caput do art. 4º da Lei nº 12.714, de 14 de setembro de 2012, a lista daquelas que satisfaçam os requisitos necessários para a concessão dos benefícios previstos neste Decreto.
§ 1º  O procedimento previsto no caput será iniciado de ofício, admitida a apresentação de requerimento da parte interessada, de seu representante, de seu cônjuge ou companheiro, de ascendente ou descendente ou do médico que assista a mulher presa.
§ 2º  O juízo da execução proferirá decisão para conceder ou não o benefício, ouvidos a defesa da beneficiária e o Ministério Público.
§ 3º  Para atender ao disposto neste Decreto, os Tribunais poderão organizar mutirões, observado o prazo de noventa dias para análise dos pedidos formulados, que terão tramitação preferencial sobre outros incidentes comuns.
§ 4º  Fica facultada ao juiz do processo de conhecimento a concessão dos benefícios previstos neste Decreto nos casos em que a sentença condenatória tenha transitado em julgado para a acusação.
Art. 4º  Aplica-se o disposto neste Decreto às mulheres transexuais que tenham alcançado a alteração de gênero nos registros civis.
Art. 5º  O indulto especial será concedido às mulheres submetidas a medida de segurança que, independentemente da cessação de periculosidade, tenham suportado privação da liberdade, internação ou tratamento ambulatorial:
I - por período igual ou superior ao máximo da pena cominada à infração penal correspondente à conduta praticada; ou
II - na hipótese de substituição da pena prevista no art. 183 da Lei nº 7.210, de 1984, por período igual ao remanescente da condenação cominada.
Parágrafo único.  A decisão que extinguir a medida de segurança, com o objetivo de reinserção psicossocial, determinará:
I - o encaminhamento a centro de atenção psicossocial ou a outro serviço equivalente na localidade em que a pessoa com transtornos mentais em conflito com a lei se encontre, previamente indicado no projeto terapêutico singular, nos termos da Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, do Ministério da Saúde; e
II - o acolhimento em serviço residencial terapêutico, nos termos da Portaria nº 3.088, de 2011, do Ministério da Saúde, previamente indicado no projeto terapêutico singular, hipótese em que a Secretaria de Saúde do Município em que a pessoa com transtornos mentais em conflito com a lei se encontre será intimada para dar efetividade ao projeto terapêutico singular ou, subsidiariamente, a Secretaria de Saúde do Estado.
Art. 6º  Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 11 de maio de 2018; 197º da Independência e 130º da República.
MICHEL TEMER
Raul Jungmann
Este texto não substitui o publicado no DOU de 11.5.2018 - Edição extra

terça-feira, 24 de abril de 2018

Mudanças na Lei Maria da Penha

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
 
Altera a Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para tipificar o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o  Esta Lei altera a Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para tipificar o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência.
Art. 2o  O Capítulo II do Título IV da Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), passa a vigorar acrescido da seguinte Seção IV, com o seguinte art. 24-A: 
Do Crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência
Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência 
Art. 24-A.  Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.
§ 1o  A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas.
§ 2o  Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança.
§ 3o  O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis.”
Art. 3o  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 
Brasília, 3 de abril de 2018; 197o da Independência e 130o da República. 
MICHEL TEMER
Torquato Jardim
Gustavo do Vale Rocha
Este texto não substitui o publicado no DOU de 4.4.2018 

Mudanças nos crimes contra o patrimônio

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 dezembro de 1940 (Código Penal), para dispor sobre os crimes de furto qualificado e de roubo quando envolvam explosivos e do crime de roubo praticado com emprego de arma de fogo ou do qual resulte lesão corporal grave; e altera a Lei nº 7.102, de 20 de junho de 1983, para obrigar instituições que disponibilizem caixas eletrônicos a instalar equipamentos que inutilizem cédulas de moeda corrente.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: 
Art. 1o  Os arts. 155 e 157 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 dezembro de 1940 (Código Penal), passam a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 155. ....................................................................
.....................................................................................
§ 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
....................................................................................
§ 7º  A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.” (NR)
“Art. 157. ....................................................................
.....................................................................................
§ 2º  A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
I – (revogado);
....................................................................................
VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.
§ 2º-A  A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços):
I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo;
II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
§ 3º  Se da violência resulta:
I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa;
II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.”(NR)
Art. 2º  A Lei nº 7.102, de 20 de junho de 1983, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 2º-A:
Art. 2º-A  As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, que colocarem à disposição do público caixas eletrônicos, são obrigadas a instalar equipamentos que inutilizem as cédulas de moeda corrente depositadas no interior das máquinas em caso de arrombamento, movimento brusco ou alta temperatura.
§ 1º  Para cumprimento do disposto no caput deste artigo, as instituições financeiras poderão utilizar-se de qualquer tipo de tecnologia existente para inutilizar as cédulas de moeda corrente depositadas no interior dos seus caixas eletrônicos, tais como:
I – tinta especial colorida;
II – pó químico;
III – ácidos insolventes;
IV – pirotecnia, desde que não coloque em perigo os usuários e funcionários que utilizam os caixas eletrônicos;
V – qualquer outra substância, desde que não coloque em perigo os usuários dos caixas eletrônicos.
§ 2º  Será obrigatória a instalação de placa de alerta, que deverá ser afixada de forma visível no caixa eletrônico, bem como na entrada da instituição bancária que possua caixa eletrônico em seu interior, informando a existência do referido dispositivo e seu funcionamento.
§ 3º  O descumprimento do disposto acima sujeitará as instituições financeiras infratoras às penalidades previstas no art. 7º desta Lei.
§ 4º  As exigências previstas neste artigo poderão ser implantadas pelas instituições financeiras de maneira gradativa, atingindo-se, no mínimo, os seguintes percentuais, a partir da entrada em vigor desta Lei:
I – nos municípios com até 50.000 (cinquenta mil) habitantes, 50% (cinquenta por cento) em nove meses e os outros 50% (cinquenta por cento) em dezoito meses;
II – nos municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) até 500.000 (quinhentos mil) habitantes, 100% (cem por cento) em até vinte e quatro meses;
III – nos municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, 100% (cem por cento) em até trinta e seis meses.”
Art. 3º  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília,  23  de  abril  de 2018; 197o da Independência e 130o da República. 
MICHEL TEMER
Eliseu Padilha
Grace Maria Fernandes Mendonça
Este texto não substitui o publicado no DOU de 24.4.2018 
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quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

STJ reconhece ilicitude de provas obtidas sem autorização de whatzap

Julgando o RHC 51.531-RO,a 6ª turma declarou ilícita a conversa extraída do whatzap sem autorização.

integra do julgado:

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 51.531 - RO (2014/0232367-7) RELATOR : MINISTRO NEFI CORDEIRO RECORRENTE : LERI SOUZA E SILVA ADVOGADOS : ROBERTO PEREIRA SOUZA E SILVA E OUTRO(S) BRUNO ESPINEIRA LEMOS RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator): Trata-se de recurso ordinário interposto por Leri Souza e Silva em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Rondônia, que denegou a ordem em writ lá impetrado. Afirma que após a apreensão do aparelho celular, sem qualquer autorização, a polícia obrigatoriamente teria que ter oficiado do Juízo, com o conhecimento do MP, antes de proceder à devassa unilateral no conteúdo do aparato, que, necessariamente, teria que ser acompanhada pelo MP e especial pela Defesa, diante dos riscos naturais do desvirtuamento, acréscimo e exclusões do conteúdo a ser extraído (fl. 84). Alega que a prova obtida sem requerimento ao Juiz natural (PERÍCIA DE, APARELHO CELULAR) que teve trâmite após a detenção do Paciente, portanto, perícia realizada em objeto já apreendido e sob a responsabilidade da Policia, sem que para isso houvesse sido requerida a autorização judicial, com os consectários fiscalizadores e asseguradores daí advindos viola os ditames do art. 5º, XII, da CF, sendo inadmissível a prova obtida de forma ilícita (art. 5º, LVI/CF), do mesmo modo disciplinando o art. 157, do CPP, razões essas, mais que suficientes para o desentranhamento das provas aqui mencionadas (fl. 93). Requer o provimento do recurso para que seja reconhecida a ilegalidade da prova mediante o desentranhamento dos autos. Contrarrazões opostas pelo Ministério Público (fls. 98/104). Informações prestadas em 22/10/2015, indicam que o feito encontra-se concluso para sentença, sendo que o paciente aguarda o processo em liberdade diante da decisão proferida em sede de medida cautelar no habeas corpus 122.555/RO , impetrado perante a Suprema Corte (fls. 125/144). O parecer Ministerial pelo desprovimento do recurso (fls. 116/118). É o relatório. Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 7 Superior Tribunal de Justiça RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 51.531 - RO (2014/0232367-7) VOTO O EXMO. SR. MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator): Consta dos autos que o paciente foi denunciado pela prática dos crimes previstos nos arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06 e art. 329 do CP. Em 6/8/2014, a Corte Estadual denegou a ordem, consoante acórdão assim ementado (fl. 61): Habeas corpus. Processo Penal. Tráfico de drogas. Prova pericial. Nulidade. Transcrição de mensagens de texto gravadas no aparelho apreendido. Inocorrência de prova ilícita. Ordem Denegada. 1 . É válida a transcrição de mensagens de texto gravadas no aparelho celular apreendido com o paciente por ocasião de sua prisão em flagrante pois estes dados não gozam da mesma proteção constitucional de que trata o art. 5º, XII. 2. Ordem denegada. Neste recurso, busca-se a decretação da ilicitude das provas extraídas do aparelho celular do recorrente dada a ausência de ordem judicial. Extrai-se do voto condutor a seguinte fundamentação (fls. 64/66): Em breve narrativa fática, consta dos autos que o paciente foi preso no dia 18/03/2014, sob a acusação de praticar o delito de tráfico de entorpecentes e ainda associação para o tráfico. A denúncia descreve que uma denúncia anônima informou que no dia em que foi preso o paciente receberia, via correios, uma carga de entorpecente. Foi realizado acompanhamento pela polícia militar e tão logo a encomenda fora entregue realizaram a abordagem, logrando êxito em apreender na posse do paciente um recipiente contendo 300 (trezentos) comprimidos de ecstasy. Investigações complementares demonstraram que o paciente se associou com os corréus com a finalidade específica de perpetrar o delito de tráfico de entorpecentes, cada um exercendo uma tarefa específica. Em informações apresentadas às fls. 40/42 a autoridade impetrada afirmou que o aparelho de telefone celular foi apreendido com o paciente por ocasião de sua prisão em flagrante, apontando que a perícia realizada no aparelho tem fundamento no art. 6º, incs. II, III e VII do CPP. Informou ainda que o acesso aos dados constantes do aparelho, no caso dos autos, não encontra o mesmo impedimento da interceptação telefônica e que a autoridade policial agiu estritamente para cumprimento da Lei. A discussão apresentada pelo impetrante circunda a Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 7 Superior Tribunal de Justiça possibilidade de realização unilateral da perícia no aparelho de telefone celular apreendido quando da prisão em flagrante sem a alegada imprescindível autorização judicial. Entendo que a tese apresentada pelo impetrante é desprovida de fundamento porquanto a proteção do acesso aos dados constantes do aparelho não se assemelha à interceptação telefônica. Inicialmente relato que o telefone celular foi apreendido no momento da prisão em flagrante do paciente, ocasião em que os policiais recolheram todos os instrumentos que poderiam estar relacionados ao crime, incluindo este aparelho, encaminhando-o à autoridade policial competente. Após a apreensão a autoridade policial conduziu a investigação conforme disposto no art. 6º do CPP, determinando a realização de perícia do entorpecente apreendido e ainda extração das conversações do aparelho celular do paciente. Assim dispõe o referido texto legal: Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: [...] II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; [...] VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; Nota-se que o legislador não atribuiu discricionariedade ao ato impugnado, pelo contrário, determina que a autoridade policial realize as ações descritas nos incisos do referido artigo. Entendo não ser imprescindível a decisão judicial para realização de perícia em aparelho celular apreendido pois a lei permite até mesmo a violação de domicílio para efetuar prisão em flagrante. Relato ainda que o Direito Penal e Processual Penal possuem natureza pública, geridos pelo Estado, representante das vontades e interesses da coletividade. Cito este fato em razão do questionamento da atividade pericial realizada, e saliento que a perícia foi realizada por agentes oficiais do Estado, legalmente incumbidos da realização dos estudos realizados, recaindo sobre eles a necessidade de observação explícita dos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, impessoalidade, dentre outros. Apresentar meras ilações acerca da possibilidade de algum dos policiais prejudicar o paciente é demasiadamente pueril, até mesmo porque não demonstrou objetivamente tal condição, não sendo relatado em momento algum dos autos a preexistência de qualquer animosidade pretérita ao fato. Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 7 Superior Tribunal de Justiça O fato é que ao empossar um agente público em seu cargo o Estado lhe confia o poder conferido pelo povo, presumindo-se legais os seus atos até ulterior conclusão contrária. Observo ainda que o art. 159 do CPP exige a realização dos trabalhos periciais por peritos oficiais, a saber: "Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior." Sobre este tema, leciona Nucci (in Código de processo penal comentado / 13. ed. rev. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense, 2014) que "perito é o especialista em determinado assunto. É considerado oficial quando investido na função por lei e não pela nomeação feita pelo juiz. Normalmente, é pessoa que exerce a atividade por profissão e pertence a órgão especial do Estado, destinado exclusivamente a produzir perícias". Com essas ponderações, considero válida a prova pericial decorrente da degravação do conteúdo constante do aparelho celular do paciente, inexistindo ainda qualquer ilegalidade a ser sanada. A Constituição Federal prevê como garantias ao cidadão a inviolabilidade da intimidade, do sigilo de correspondência, dados e comunicações telefônicas - salvo ordem judicial: Art. 5º. [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; [...] XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; No caso das comunicações telefônicas, a Lei n. 9.294/96 regulamentou o tema: Art. 1º. A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça. Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática. Art. 5º. A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 7 Superior Tribunal de Justiça comprovada a indispensabilidade do meio de prova. A Lei n. 9.472/97, ao dispor sobre a organização dos serviços de telecomunicações, prescreve: Art. 3º. O usuário de serviços de telecomunicações tem direito: [...] V - à inviolabilidade e ao segredo de sua comunicação, salvo nas hipóteses e condições constitucional e legalmente previstas; E a Lei 12.965/14, que estabelece os princípios, garantias e deveres para o uso da Internet no Brasil, prevê que: Art. 7º. O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são assegurados os seguintes direitos: I - inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; II - inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, salvo por ordem judicial, na forma da lei; III - inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial; [...] Na perícia realizada, houve acesso aos dados do celular e às conversas de whatsapp obtidos sem ordem judicial. No acesso aos dados do aparelho, tem-se devassa de dados particulares, com violação à intimidade do agente. Embora possível o acesso, necessária é a prévia autorização judicial devidamente motivada: RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. DILIGÊNCIAS PARA VERIFICAR O REGULAR CUMPRIMENTO DA PENA. DECISÃO DESPROVIDA DE FUNDAMENTAÇÃO. 1. Embora não sejam absolutas as restrições de acesso à privacidade e aos dados pessoais do cidadão, e mesmo considerado o interesse público no acompanhamento da execução penal, imprescindível é a qualquer decisão judicial a explicitação de seus motivos (art. 93, IX, da Constituição Federal). 2. Diligências invasivas de acesso a dados (bancários, telefônicos e de empresa de transporte aéreo) deferidas sem qualquer menção à necessidade e proporcionalidade dessas medidas investigatórias, não propriamente de crime, mas de regular cumprimento de pena imposta. Nulidade reconhecida. 3. Recurso especial parcialmente provido. Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 5 de 7 Superior Tribunal de Justiça (REsp 1133877/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 02/09/2014). PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. 1. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 157 DO CPP. OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO PELO DELITO DO ART. 1º, I, DA LEI N. 8.137/1990. QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. NULIDADE DA PROVA. 2. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Afigura-se decorrência lógica do respeito aos direitos à intimidade e à privacidade (art. 5º, X, da CF) a proibição de que a administração fazendária afaste, por autoridade própria, o sigilo bancário do contribuinte, especialmente se considerada sua posição de parte na relação jurídico-tributária, com interesse direto no resultado da fiscalização. Apenas o Judiciário, desinteressado que é na solução material da causa e, por assim dizer, órgão imparcial, está apto a efetuar a ponderação imprescindível entre o dever de sigilo - decorrente da privacidade e da intimidade asseguradas ao indivíduo, em geral, e ao contribuinte, em especial - e o também dever de preservação da ordem jurídica mediante a investigação de condutas a ela atentatórias. 2. Recurso especial a que se dá provimento para reconhecer a ilicitude da prova advinda da quebra do sigilo bancário sem autorização judicial, determinando-se que seja proferida nova sentença, afastada a referida prova ilícita e as eventualmente dela decorrentes. (REsp 1361174/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 10/06/2014). Na conversas mantidas pelo programa whatsapp , que é forma de comunicação escrita, imediata, entre interlocutores, tem-se efetiva interceptação inautorizada de comunicações. É situação similar às conversas mantidas por e-mail, onde para o acesso tem-se igualmente exigido a prévia ordem judicial: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO REVELAÇÃO. CORRUPÇÃO ATIVA. MEDIDAS CAUTELARES DETERMINADAS. AFASTAMENTO DE SIGILO DE CORREIO ELETRÔNICO. DURAÇÃO DA CONSTRIÇÃO. PRAZO: DE 2004 A 2014. FUNDAMENTAÇÃO PARA A QUEBRA DO SIGILO DO E-MAIL NO PERÍODO. AUSÊNCIA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. NÃO OBSERVÂNCIA. OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. FLAGRANTE ILEGALIDADE. EXISTÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A quebra do sigilo do correio eletrônico somente Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 7 Superior Tribunal de Justiça pode ser decretada, elidindo a proteção ao direito, diante dos requisitos próprios de cautelaridade que a justifiquem idoneamente, desaguando em um quadro de imprescindibilidade da providência. 2. In casu, a constrição da comunicação eletrônica abrangeu um ancho período, superior a dez anos, de 2004 a 2014, sem que se declinasse adequadamente a necessidade da medida extrema ou mesmo os motivos para o lapso temporal abrangido, a refugar o brocardo da proporcionalidade, devendo-se, assim, prevalecer a garantia do direito à intimidade frente ao primado da segurança pública. 3. Lastreadas as decisões de origem em argumentos vagos, sem amparo em dados fáticos que pudessem dar azo ao procedimento tão drástico executado nos endereços eletrônicos do acusado, de se notar certo açodamento por parte dos responsáveis pela persecução penal. 4. Ordem concedida, com a extensão aos co-investigados em situação análoga, a fim de declarar nula apenas a evidência resultante do afastamento dos sigilos de seus respectivos correios eletrônicos, determinando-se que seja desentranhado, envelopado, lacrado e entregue aos respectivos indivíduos o material decorrente da medida. (HC 315.220/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 15/09/2015, DJe 09/10/2015). Atualmente, o celular deixou de ser apenas um instrumento de conversação pela voz à longa distância, permitindo, diante do avanço tecnológico, o acesso de múltiplas funções, incluindo, no caso, a verificação da correspondência eletrônica, de mensagens e de outros aplicativos que possibilitam a comunicação por meio de troca de dados de forma similar à telefonia convencional. Deste modo, ilícita é tanto a devassa de dados, como das conversas de whatsapp obtidos de celular apreendido, porquanto realizada sem ordem judicial. Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso ordinário em habeas corpus, para declarar a nulidade das provas obtidas no celular do paciente sem autorização judicial, cujo produto deve ser desentranhado dos autos.

Fonte: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?num_registro=201402323677&aplicacao=processos.ea

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