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“O Direito Penal tem cheiro, cor, raça, classe social; enfim, há um grupo de escolhidos, sobre os quais haverá a manifestação da força do Estado.” (Rogério Greco – Direito Penal do Equilíbrio)

quarta-feira, 24 de julho de 2013

CARTA ABERTA À COMUNIDADE JURÍDICA



Nós professores das áreas de DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL, abaixo assinados, através do presente instrumento, vimos manifestar nossa profunda inconformidade diante dos insuperáveis erros cometidos no X EXAME UNIFICADO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, realizada no dia 16 de Junho de 2013, pelos fatos e fundamentos seguintes:

PARTE I

1 – CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

É de conhecimento público que a Fundação Getúlio Vargas, respeitável Instituição responsável pela organização e aplicação do Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), divulgou tanto o enunciado das questões, como tambem o denominado “gabarito comentado”, considerado pelo próprio “padrão de respostas” para a prova da 2a fase do X Exame Unificado.
O denominado “gabarito comentado”, também conhecido como “espelho”, surpreendeu a todos pelo inusitado, pelo imponderável, pelo absurdo que representa a resposta exigida pela Instituição Examinadora, inviabilizando uma correção justa, coerente e conforme com o padrão de entendimento da matéria no âmbito da academia, do meio jurídico, da doutrina e da própria jurisprudência de nossos tribunais.

Aliás, exatamente por conhecrem a matéria, por saberem a resposta que a questão comportava, mesmo lacunosa, incompleta e obscura, acabaram respondendo errado, segundo a ótica equivocada da Instituiçao Examinadora.
É de conhecimento público que a Coordenação do Exame de Ordem e a FGV, atendendo a reinvindicação de milhares de candidatos, anunciaram, em 20 de Junho de 2013, A ANULAÇÃO DE DUAS QUESTÕES DISCURSIVAS DA PROVA PRÁTICO-PROFISSIONAL NA ÁREA DE DIREITO CIVIL, do mesmo X Exame, sob a alegação de que versariam exclusivamente sobre temas jurisprudenciais, aos quais os examinandos não teriam acesso durante a realização da prova.
Pois, bem, em razão dessa correta e, diga-se de passagem, acertada decisão, atribuíram a todos os candidatos, daquela área, a pontuação integral (2,5 pontos) pelas duas questões anuladas.
No entanto, contraditoriamente, violando o princípio da isonomia, ainda não adotaram a mesma providência para a prova de Direito Penal, que incorreu em erros crassos, quiçá mais graves que em outras disciplinas, como passamos a demonstrar adiante.
Vejamos a seguir, nossas considerações técnico-jurídicas sobre a prova referida, começando pela questão prática.

PARTE II
ASPECTOS  FÁTICO-JURÍDICOS

II.1 - TEXTO LEGAL
 Art. 155. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena — reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
(..)
§ 5º A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.
§ 5º acrescentado pela Lei n. 9.426, de 24-12-1996.

II.2 – ENUNCIADO DA QUESTÃO PRÁTICA PROPOSTA

“Leia com atenção o caso concreto a seguir:
Jane, no dia 18 de outubro de 2010, na cidade de Cuiabá – MT, subtraiu veículo automotor de propriedade de Gabriela. Tal subtração ocorreu no momento em que a vítima saltou do carro para buscar um pertence que havia esquecido em casa, deixando-o aberto e com a chave na ignição. Jane, ao ver tal situação, aproveitou-se e subtraiu o bem, com o intuito de revendê-lo no Paraguai. Imediatamente, a vítima chamou a polícia e esta empreendeu perseguição ininterrupta, tendo prendido Jane em flagrante somente no dia seguinte, exatamente quando esta tentava cruzar a fronteira para negociar a venda do bem, que estava guardado em local não revelado. Em 30 de outubro de 2010, a denúncia foi recebida. No curso do processo, as testemunhas arroladas afirmaram que a ré estava, realmente, negociando a venda do bem no país vizinho e que havia um comprador, terceiro de boa-fé  arrolado como testemunha, o qual, em suas declarações, ratificou os fatos. Também ficou apurado que Jane possuía maus antecedentes e reincidente específica nesse tipo de crime, bem como que Gabriela havia morrido no dia seguinte à subtração, vítima de enfarte sofrido logo após os fatos, já que o veículo era essencial à sua subsistência. A  ré confessou o crime em seu interrogatório. Ao cabo da instrução criminal, a ré foi condenada a cinco anos de reclusão no regime inicial fechado para cumprimento da pena privativa de liberdade, tendo sido levada em consideração a confissão, a reincidência específica, os maus antecedentes e as consequências do crime, quais sejam, a morte da vítima e os danos decorrentes da subtração de bem essencial à sua subsistência. A condenação transitou definitivamente em julgado, e a ré iniciou o cumprimento da pena em 10 de novembro de 2012. No dia 5 de março de 2013, você, já na condição de advogado(a) de Jane, recebe em seu escritório a mãe de Jane, acompanhada de Gabriel, único parente vivo da vítima, que se identificou como sendo filho desta. Ele informou que, no dia 27 de outubro de 2010, Jane, acolhendo os conselhos maternos, lhe telefonou, indicando o local onde o veículo estava escondido. O filho da vítima, nunca mencionado no processo, informou que no mesmo dia do telefonema, foi ao local e pegou o veículo de volta, sem nenhum embaraço, bem como que tal veículo estava em seu poder desde então. 
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija a peça cabível, excluindo a possibilidade de impetração de Habeas Corpus, sustentando, para tanto, as teses jurídicas pertinentes”. (Valor: 5,0).

II.3 – GABARITO COMENTADO PELA OAB

O candidato deve redigir uma revisão criminal, com fundamento no art. 621, I e/ou III, do Código de Processo Penal. Deverá ser feita uma única petição, dirigida ao Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, onde o candidato deverá argumentar que, após a sentença, foi descoberta causa especial de diminuição de pena, prevista no art. 16 do Código Penal, qual seja, arrependimento posterior. O agente, anteriormente ao recebimento da denúncia, por ato voluntário, restituiu a res furtiva, sendo certo que tal restituição foi integral e que, portanto, faz jus ao máximo de diminuição. Assim, deverá pleitear, com base no art. 626 do Código de Processo Penal, a modificação da pena imposta, para que seja considerada referida causa de diminuição de pena.
Além disso, o fato novo comprova que o veículo não chegou a ser transportado para o exterior, não tendo se iniciado qualquer ato de execução referente à qualificadora prevista no §5º do artigo 155 do Código Penal. Por isso, cabível a desclassificação do furto qualificado para o furto simples (artigo 155, caput, do Código Penal).
Como consequência da aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 16 do CP e da desclassificação do delito, o examinando deverá desenvolver raciocínio no sentido de que, em que pese a reincidência da revisionanda, o STJ tem entendimento sumulado no sentido de que poderá haver atribuição do regime semiaberto para cumprimento da pena privativa de liberdade (verbete 269 da Súmula do STJ).
Além disso, o fato de a revisionanda ter reparado o dano de forma voluntária prepondera sobre os maus antecedentes e demonstra que as circunstâncias pessoais lhe são favoráveis. Por isso, a fixação do regime fechado se mostra medida desproporcional e infundada, devendo ser abrandado o regime para o semiaberto, com base na no verbete 269 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
Ao final, o examinando deverá elaborar, com base no art. 626 do CPP, os seguintes pedidos: i. a desclassificação da conduta, de furto qualificado para furto simples; ii. a diminuição da pena da pena privativa de liberdade; iii. a fixação do regime semiaberto (ou a mudança para referido regime) para o cumprimento da pena privativa de liberdade. 
(...)

PARTE  III
AVALIAÇÃO JURÍDICA
 III. 1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TERRITORIALIDADE E TIPICAÇÃO
Antes de mais nada, deve-se examinar, preliminarmente,  um aspecto básico, que, na nossa concepção, funciona como um verdadeiro pressuposto desse crime, qual seja, a territorialidade, que é, ao mesmo tempo, uma elementar normativa especial do crime de “furto qualificado de veículo automotor”. Esse aspecto é fundamental, na medida em que a qualificadora especial somente se configura “se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior” (§ 5º do art. 155). Dito de outra forma, não haverá essa qualificadora se a res furtiva, representada por veículo automotor, não sair dos limites territoriais da Unidade Federativa onde foi subtraído!
Nesse sentido, tivemos oportunidade demonstrar em nosso Tratado de Direito Penal, Parte Especial, volume 3, 2013, p. 81: “b) para a configuração da nova qualificadora, não basta que a subtração seja de veículo automotor: é indispensável que este ‘venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior’. Se o veículo automotor ficar na mesma unidade federativa, não incidirá a qualificadora, pois essa elementar integra o aspecto material dessa especial figura qualificada”. Reforçando, é indispensável que o veículo automotor “venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior”.
Pela construção da questão prática e da proposta exigida pela OAB, no entanto, constata-se que foi ignorada que a qualificação do crime não ocorre somente com o transporte da res furtiva “para o exterior”, mas também  quando é transportado “para outro Estado”. Trata-se de elementar típica que não admite interpretação diversa. O elemento subjetivo não pode ser presumido, mas deve decorrer das próprias circunstâncias fáticas.
Com efeito, no enunciado da questão proposta afirma-se que Jane foi presa quando tentava cruzar a fronteira do Paraguai para negociar o veículo; por outro lado, a OAB afirma no “gabarito comentado”, que é o seu modelo de resposta esperada, “que o veículo não chegou a ser transportado para o exterior, não tendo se iniciado qualquer ato de execução referente à qualificadora prevista no §5º” do artigo 155 do CP.   

Veja-se, nos próprios termos do “gabarito comentado” da OAB, verbis:

“Além disso, o fato novo comprova que o veículo não chegou a ser transportado para o exterior, não tendo se iniciado qualquer ato de execução referente à qualificadora prevista no §5º do artigo 155 do Código Penal. Por isso, cabível a desclassificação do furto qualificado para o furto simples (artigo 155, caput, do Código Penal)”.

Dessas afirmações da prova da OAB chega-se a seguinte conclusão: ou a OAB desconhece o tipo penal do “furto qualificado de veículo automotor” (ou esqueceu, o que é mais provável, que é suficiente o transporte da res furtiva para fora do estado), ou desconhecem a geografia de nosso País.

Ora, essa conclusão é inevitável, senão vejamos, segundo os dados propostos: o furto ocorreu em Cuiabá, Estado do Mato Grosso; a autora do furto foi presa na fronteira do Paraguai, e a OAB afirma que ela não saiu para o exterior, logo, deve-se concluir, não passou pela Bolívia! Ora, ou suprimimos o Estado do Mato Grosso Sul, reitegrando-o ao Estado de Mato Grosso (o que causaria uma justa revolução naquele Estado), ou os examinadores equivocaram-se na formulação da questão e na proposição da resposta desejada.
Constata-se, em outros termos, que a resposta pretendida pela OAB é juridicamente impossível, qual seja, a de desqualificar o crime de furto de veículo automotor, por não configuração da qualificadora, na medida em que a ação foi praticada em Cuiabá e a autora foi presa na fronteira do Paraguai tentando entrar naquele País para vendê-lo, tendo percorrido, portanto, todo o Estado do Mato Grosso do Sul. Ou seja, transportou-o para outro Estado.
 Examinando, enquanto doutrinador, o “furto de veículo automotor”, logo após a publicação da Lei nº 9.426, de 24-12-1996, fizemos as seguintes considerações”:

A Lei n. 9.426, de 24 de dezembro de 1996, cria uma nova figura de furto qualificado, distinta daquelas relacionadas no § 4º do art. 155, sempre que a coisa móvel, objeto da ação, consistir em veículo auto­mo­tor (automóveis, caminhões, lanchas, aeronaves, motocicletas, jet skis etc.). Com essa nova qualificadora (§ 5º), pretendeu-se inibir a conduta de subtrair veículo automotor, exasperando exageradamente a sanção correspondente, fixando-a entre três e oito anos de reclusão.
(...)
Essa nova previsão merece, objetivamente, dois destaques: a) esqueceu-se de tipificar o chamado furto de uso, tão corriqueiro na atualidade, que, reconhecidamente, constitui figura atípica; e b) para a configuração da nova qualificadora, não basta que a subtração seja de veículo automotor: é indispensável que este ‘venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior’. Se o veículo automotor ficar na mesma unidade federativa, não incidirá a qualificadora, pois essa elementar integra o aspecto material dessa especial figura qualificada”.
Sintetizando, os furtos de veículos automotores, em geral, não são atingidos pela nova qualificadora acrescentada pela referida lei. Em ou­tros termos, as tradicionais e costumeiras subtrações de veículos auto­mo­tores, que perturbam o quotidiano do cidadão, não serão alcançadas pela nova qualificadora se não vierem, efetivamente, “a ser transportados para outros Estados ou para o exterior”. Com efeito, a incidência da qualificadora, nos termos legais, exige que o veículo tenha ultrapassado os limites territoriais do Estado-membro ou do próprio território nacional, pois se trata de elementar objetiva espacial.
Essa qualificadora cria um problema sério sobre o momento consumativo da nova figura delitiva. Afinal, pode um tipo penal apresentar dois momentos consumativos distintos, um no momento da subtração e outro quando ultrapassar a fronteira de um Estado federado ou do próprio País? Com efeito, quando o agente pratica a subtração de um veículo automotor, em princípio é impossível saber, com segurança, se será transportado para outro Estado ou para fora do território nacional. Assim, essa qualificadora somente se consuma quando o veículo ingressa efetivamente em outro Estado ou em território estrangeiro. Na verdade, não basta que a subtração seja de veículo automotor. É indispensável que este “venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior”, atividade que poderá caracterizar um posterius em relação ao crime anterior já consumado. Nessas circunstâncias, é impossível, em regra, reconhecer a tentativa da figura qualificada quando, por exemplo, um indivíduo é preso, no mesmo Estado, dirigindo um veículo furtado.
Teria sido mais feliz a redação do § 5º se tivesse, por exemplo, se utilizado do tradicional elemento subjetivo do injusto, isto é, prevendo, como especial fim de agir, a venda ou transporte “para outro Estado ou para o exterior”. Como se sabe, o especial fim de agir, embora amplie o aspecto subjetivo do tipo, não integra o dolo nem se confunde com ele. Efetivamente, os elementos subjetivos especiais do injusto especificam o dolo, sem com ele se confundir. Não é necessário que se concretizem, sendo suficiente que existam no psiquismo do autor”.


Enfim, venia concessa, por mais que não se queira ser deselegante, nessa questão, a OAB foi reprovada!!! Errou grosseiramente, tanto na formulação da questão (excluiu expressamente a única peça viável, um HC), como também e, principalmente, na resposta exigida! A conduta descrita, a despeito de suas lacunas, configura, em tese, o furto qualificado de veículo automotor, tipificado no § 5º do art. 155 do CP. Por isso, é juridicamente insustentável defender a desclassificação do crime, pelo simples de fato de o veículo furtado não ter sido transportado para o exterior, na medida e quem o foi para outro Estado.

Sem se falar que a indicação do local onde o veículo se encontrava (arrependimento) ocorreu antes do recebimento da denúncia. A defesa devia, portanto, ter sido diligente e fazer a prova durante a instrução criminal. Nova, portanto, foi a comprovação do fato, logo, extemporânea.
    
III.2 – AVALIAÇÃO JURÍDICA DE ALGUNS DOUTRINADORES
Pedimos venia para transcrever parte do pensamento de alguns doutrinadores que tornaram pública, nas redes sociais, o seu entendimento, que acompanham, na essência, a nossa concepção dos fatos. No entanto, destacamos que há uma infinidade de professores adotando o mesmo entendimento, mas por sua qualificada quantidade torna-se impossível transcrever aqui todas as suas manifestações. Contudo, a subscrição deste peticionamento comprova que adotam o mesmo entendimento quanto aos erros crassos que essa questao apresenta.
Passemos então a trazer a colação o pensamento de alguns desses preclaros pensadores.
O aclamadíssimo PROF. DR. EUGENIO PACELLI, ilustre Membro do Ministério Público Federal, em uma de suas manifestações no Facebook, pontificou: 
      "Em recentíssimo e ainda comentado exame da OAB "caiu" questão atinente ao furto de veículo automotor, cujo agente teria sido preso em flagrante em região de fronteira com outro país! O veículo teria sido subtraído no Mato Grosso do Sul.
Ora, sabendo-se que, dali, do Mato Grosso do Sul, para se chegar à fronteira com qualquer país, o veículo teria que ser "transportado para outro Estado", a qualificadora do §5º, do art. 155, CP, parece ter sido consumada.
E como o espelho de resposta parece desconsiderar essa circunstância (há outras, é verdade, que poderiam ser sustentadas como razões para a diminuição da pena), a desclassificação apontada ali (no espelho de respostas) presta-se a desconsiderar o aluno mais atento, que teria percebido a alteração da coisa subtraída para outro estado da Federação.
Embora a questão não o diga expressamente - chegando a dar ênfase no fato de ter-se chegado à fronteira com outro país - não se chega ali (à fronteira) sem que se "atravesse - e, assim, se transporte - (para) outro Estado.
Nesse passo, e nessa perspectiva, a questão está errada, no ponto em que fala em desclassificação de furto qualificado para furto simples.
E, de outro lado, se a interpretação é no sentido de que a simples "passagem" do veículo por outro Estado não configuraria o tipo qualificado, a resposta estaria ainda mais equivocada, até mesmo a se julgar pela resposta do espelho, na qual se afirma, expressamente a viabilidade da desclassificação! Ora, desclassificar do quê para o quê? Da tentativa (para o exterior) para o furto simples?
Em resumo: não andou bem a banca na questão! Espera-se que assim se comporte na correção!" - Eugenio Pacelli de Oliveira

Com a permissão, do caríssimo PROFESSOR E MAGISTRADO MINEIRO, DR. ANTONIO JOSÉ PÊCEGO, reproduzimos a sua adesão e reforço a nossa tese, in verbis:

"Prezados, o que o Professor Cezar Roberto Bitencourt explana neste post é o óbvio que dispensa comentários, sendo que qualquer argumento em contrário é mera especulação ou de quem tem interesse de desestabilizar. Se a ação for ganha, no que acredito, não haverá prejudicados, do contrário, na haverá alteração no quadro atual. Só sei de uma coisa que todos sabem, o direito não socorre a quem dorme. Exerça a sua cidadania com plenitude que é a expressão máxima de ter direito a ter direitos. Princípio fundamental e estruturante do nosso Estado Democrático de Direito. Confiem no renomado Prof. Dr. Cezar Roberto Bitencourt que, depois de tantos anos de dedicação profissional que lhe conferiu respeito e admiração no meio acadêmico e profissional, não seria por isso que iria jogar pela janela tudo que realizou até hoje".
       
Na mesma linha de pensamento, o digno e culto Conselheiro Federal da OAB, pelo Rio Grande do Sul, o ex-Diretor da Escola Superior da OABRS, o Professor da PUCRS, ALEXANDRE WUNDERLICH emitiu parecer pela anulação parcial da referida questão prática. Destacamos desse parecer, com sua autorização, a seguinte passagem:

11. Sobre o problema proposto pela Banca, o renomado penalista Cezar Roberto Bitencourt, ex-Conselheiro Federal da OAB, fez uma crítica visceral ao escrever um texto sob o título “OAB erra na formulação de questão do Exame de Ordem”, publicado na Revista Consultor Jurídico em 15 de julho de 2013.[1]
12. Em resumo, o Professor Cezar Roberto Bitencourt[2] sublinhou:
 (...)    

13. O texto provocativo e, para além de haurir divergência, é revelador da dúvida que o questionamento ensejou aos examinandos e à comunidade jurídica.
14. A verdade é que a má-formulação da questão, que é marcada pela falta de objetividade e pela carência de dados concretos, possibilitou várias hipóteses sobre o caso penal.[3]
         15. Para Cezar Roberto Bitencourt, se a res furtiva não fosse levada ao exterior ou não saísse do Estado, seria possível uma tese da desclassificação. Todavia, pela narrativa da própria questão, por razões geográficas, pode-se entender que a res furtiva cruzou o Mato Grosso do Sul (parou noutro Estado), impossibilitando a tal tese de desclassificação exigida pela Banca.
(...)
17. É relevante a posição do Professor Cezar Roberto Bitencourt no sentido de que não incide a qualificadora “se a res furtiva, representada por veículo automotor, não sair dos limites territoriais da Unidade Federativa onde foi subtraído!”
18. Pela construção da questão prática, no entanto, constata-se que realmente foi ignorada que a qualificação do crime não ocorre somente com o transporte da res furtiva para o “exterior”, mas também quando o bem é transportado para outro “Estado”. É, pois, falho o gabarito.
19. No enunciado proposto consta que Jane foi presa quando tentava cruzar a fronteira do Paraguai para negociar o bem furtado. De outro lado, a Banca exige no gabarito comentado (modelo de resposta) que o veículo não chegou a ser transportado para o exterior, não tendo se iniciado qualquer ato de execução referente à qualificadora prevista no §5º” do artigo 155 do CP.
20. Basta conferir o gabarito para verificar que o fato novo a ensejar revisão criminal foi: “que o veículo não chegou a ser transportado para o exterior”, “não tendo se iniciado qualquer ato de execução referente à qualificadora prevista no §5º do artigo 155 do Código Penal”.
21. De fato, o Professor Cezar Roberto Bitencourt está legitimado a pensar que o gabarito cita “exterior”, mas não cita “Estado”, sendo que o furto do bem ocorreu em Cuiabá (MT), restando Jane (autora do furto) presa em flagrante na fronteira do Paraguai. 
22. Entretanto, admitindo-se por epítrope, esteja errado o Professor Cezar Roberto Bitencourt ao referir que a condenada Jane teria percorrido o Estado do Mato Grosso do Sul para tentar vender o veículo no Paraguai, ainda assim, sublinhe-se, a questão é parcialmente viciada.
(...)
24. O ponto nuclear da discussão é que a prova que exigiu a elaboração da peça processual é omissa, pois em nenhum momento indica claramente onde está/foi deixado o veículo furtado.
25. Então, estamos diante da seguinte situação:
a)                 se efetivamente entendermos que o veículo estava com a condenada Jane, que por sua vez não cruzou a fronteira, por razão óbvia, o bem entrou/atravessou o Estado do Mato Grosso do Sul, não ensejando possibilidade de desclassificação, pois o furto seria, de qualquer forma, “qualificado” – “se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior” (§ 5º do art. 155)”. [Esta posição é defendida pelo Professor Cezar Roberto Bitencourt.]

b)                 se, ao contrário, entendermos que a condenada Jane não dirigiu/fugiu com o veículo até a fronteira, cabe o questionamento que é imperativo: onde ficou o veículo furtado?
          A resposta é que da questão proposta não se pode extrair o local onde a res furtiva foi deixada/encontrada pelo filho da vítima.
         No ponto, diz a questão: “exatamente quando esta tentava cruzar a fronteira para negociar a venda do bem, que estava guardado em local não revelado.” “...No dia 5 de março de 2013, você, já na condição de advogado(a) de Jane... Ele informou que, no dia 27 de outubro de 2010, Jane, acolhendo os conselhos maternos, lhe telefonou, indicando o local onde o veículo estava escondido.” O filho da vítima, nunca mencionado no processo, informou que no mesmo dia do telefonema, foi ao local e pegou o veículo de volta...”
           Esta omissão gravíssima por parte da Banca Examinadora, leva ao vício parcial do questionamento, igualmente como exposto no item “a”.
26. Mais. A d. Banca exige no próprio questionamento que o candidato formule a peça com “base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima”.
27. Ou seja: o próprio enunciado diz que não cabe ao examinando presumir ou criar teses com base em meras ilações. É vedada a suposição fática.
28. Errou na formulação do problema e na sua exposição, a Banca Examinadora do X Exame Nacional da OAB.
29. A injustiça reside fundamentalmente nos itens 4 e 6 do gabarito:

Item 4: “Desenvolvimento jurídico acerca da desclassificação para furto simples (0,50), pois não houve efetivo deslocamento do bem para o exterior (0,50) (...)” = 1,00.

Item 6: “Dos pedidos: Com fundamento no art. 626 do CPP (0,25): 6.1) Desclassificação para o delito de furto simples(0,25)(...)” = 0,25.

30. Inquestionavelmente, a má formulação leva à nulidade tópica da questão que impõe a elaboração da peça prático-profissional, devendo, no mínimo, as exigências dos itens 4 e 6, serem parcialmente anuladas, agregando-se aos examinandos, por justiça, a pontuação de  1,25, integralmente”. (Alexandre Wunderlich).

        
Concluindo, enfim, em uma análise superficial, nos limitamos a examinar a tipificação e a elementar normativa espacial do tipo penal qualificado. Consideramos, para esta tarefa preliminar, prejudicados os demais elementos, por não interessar aqui.
Por isso, acreditamos que a questão proposta é nula de pleno direito, impondo-se a atribuição integral da nota correspondente a todos os examinandos (ou, no mínimo, os mesmos dois pontos e meio (2,5) que foram atribuídos aos candidatos da área de Direito Civil.
     
IV – CONCLUSÃO

Os requerentes registram, preliminarmente, a convicção do acolhimento do presente pedido, pelos fundamentos acima expostos, na mesma linha da decisão adotada em relação aos examinandos inscritos em DIREITO CIVIL, bem como aos inscritos em DIREITO TRIBUTÁRIO, atribuindo-se-lhes os respectivos pontos, ou, pelo menos, dois pontos e meio (2,5) que foram atribuídos aos examiandos de Direito Civil, por uma questão isonomia.
Requerem, finalmente, a Egrégia Comissão Nacional de Exame da Ordem dos Advogados do Brasil, que, em nome de sua responsabilidade institucional, e em respeito aos direitos civis e as garantias fundamentais da sociedade brasieira, reconheça os equivocos apresentdos pela questão prática de Direito Penal, haja por bem anulá-la, pelos fundamentos acima expostos, além de outros que considerar pertinentes, atribuindo a pontuação correspondente a todos os examinandos que fizeram a respectiva prova (nos moldes referidos no parágrafo supra), como medida da mais lídima
 J U S T I Ç A !
Subscrevem a presente, todos os professores abaixo relacionados, cuja adesão foi manifestada via Facebook, via email e via torpedos (msm).

                                 Brasília, 23 de julho de 2013.

CEZAR ROBERTO BITENCOURT
Doutor em Direito Penal (Universidade de Sevilha, Espanha). Advogado e Professor Universitário, além disso, um dos maiores doutrinadores contemporâneos do Brasil, Ex-Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Ciências Penais lato senso, na PUCRS, Professor de Direito Penal no  Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Ciências Criminais da PUCRS, Professor  convidado do  Curso de Doutorado em Direito Penal na Universidade Pablo de Olavide, em Sevilha, Espanha, Professor convidado do Curso de Pós-Graduação em Ciências Penais (lato senso) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Co-autor do projeto de Mestrado interdisciplinar em Ciências Criminais da PUCRS, Diretor da Escola Superior do Ministério Público/RS, Ex-professor de Direito Penal na Escola Superior do Ministério Público, Diretor-Presidente do CESUPA - Centro de Ensino Superior de Porto Alegre.

LUIZ FLÁVIO GOMES
Diretor geral dos cursos de Especialização Tele Virtuais da LFG. Doutor em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri (2001). Mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo USP (1989). Professor de Direito Penal e Processo Penal em vários cursos de Pós-Graduação no Brasil e no exterior, dentre eles da Facultad de Derecho de la Universidad Austral, Buenos Aires, Argentina. Professor Honorário da Faculdade de Direito da Universidad Católica de Santa Maria, Arequipa, Peru. Promotor de Justiça em São Paulo (1980-1983). Juiz de Direito em São Paulo (1983-1998).

FELIPE NOVAES
Advogado, Doutorando em Direito Penal, Mestre em Direito Penal pela UGF-RJ, Especialista em Direitos Humanos pela UPO - Espanha, Coordenador do Curso Fórum - RJ, Coordenador do Curso Cejus - BA, Professor de Direito Penal em diversos curso preparatórios para concursos públicos: Curso Fórum - RJ, Curso CEJUS - BA, Supremo Concursos - MG, Curso Lexus - RJ, Curso Jurídico - PR e Fórum TV - On line.

RODRIGO BELLO
Advogado e Palestrante. Pós-Graduado Lato Sensu em Ciências Criminais pela UGF-RJ. Colaborador do Instituto Millenium. Professor de Processo Penal e Leis Especiais dos cursos: Curso Fórum - Rio de JaneiroCurso Fórum TV On-LineCurso Supremo - Belo Horizonte - MGCurso Supremo TV On-Line; Aulas Ministradas ainda nas cidades de Curitiba-PR, Recife-PE, Salvador-BA, Volta Redonda-RJ, Ipatinga-MG.

PAULO HENRIQUE FULLER
Juiz de Direito e professor de Processo Penal do Complexo Educacional Damásio de Jesus. Mestre em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

ANDRÉ NICOLITT
Juiz de Direito no Rio de Janeiro e Professor Universitário.

ROGÉRIO SANCHES CUNHA
Promotor de Justiça no Estado de São Paulo. Professor da Escola Superior do Ministério Público. Professor de Penal e Processo Penal.

PATRICIA VANZOLINI
Professora de Penal e Processo Penal do Complexo Educacional Damásio de Jesus.

BRUNO QUEIROZ
Advogado e Professor de Direito Penal.

RODRIGO ALMENDRA
Advogado e Professor de Direito Penal e Processo Penal.

GEOVANE MORAES E ANA CRISTINA MENDONÇA.
Advogados e Professores de Direito Penal e Processo Penal no Complexo de Ensino Renato Saraiva.

ALEXANDRE WUNDERLICH
Advogado. Especialista e Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS. Atual Professor Coordenador do Departamento de Direito Penal e Processual Penal e do Curso de Pós-graduação em Direito Penal Empresarial da PUCRS.

DAVI ANDRÉ
Advogado. Professor de Direito Penal e Processual Penal do IDC e Verbo Jurídico.

RICARDO HENRIQUE GIULIANI
Defensor Público da União. Professor de Direito Penal e Processual Penal.

FABRICIO DA MATA CORRÊA
Advogado Criminalista. Especialista em Ciências Penais. Professor de Direito Penal e Processual Penal.



[2] De igual modo, o Professor Luiz Flávio Gomes também concordou com as críticas.
[3] Aliás, esta é a posição externada pelo Professor Rogério Sanches Cunha, que chegou a usar a expressão “achismo” para classificar a exigência de desclassificação feita pela d. Banca.

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